Cronicamente online
Beleza que a sua terapia está em dia, que tá todo mundo medicado e vegano - mas tá todo mundo mal.
Geralmente, se você receber um áudio meu no whatsapp, vai vir acompanhado de: “Não tem pressa”.
Porque eu só mando áudio se for algo que eu quero falar livremente, uma brisa… sem alimentar a timeline infinita.
É tanta informação, tanta informação, que eu me pego evitando escrever criar para a internet porque parece que não há mais nada para ser dito online.
Eu simplesmente não aguento mais tanta opinião sobre tudo. Inclusive a minha. E tá tudo bem: quase nenhuma opinião precisa importar.
Eu acho que estamos vivendo um período incomparável na história da humanidade. Sem querer soar alarmista — quem sou eu na fila do aquecimento global? — mas, tirando os privilegiados e os iludidos, todo mundo parece triste & desanimado™.
Você pegou transporte público recentemente? Não tem uma risadinha.
E já reparou que agora é popular ser ranzinza e mal-educado? É complicado para quem é rabugento de verdade continuar indie.
Outro dia, uma mulher foi feita refém no ponto de ônibus em São Paulo capital. Na entrevista, quando tudo se resolveu, ela disse que estava preocupada que ia atrasar para o próximo compromisso.
Sem tempo para sequestro, brother!
Mais assustador que um sequestro, me parece, é não estar presente no próprio sequestro.
Aliás, você que mora nessa cidade maluca, já tentou marcar um rolê com os amigos?
Porque a agenda do paulistano... é sinal do fim dos tempos.
Eu queria escrever uma crônica engraçadinha, ácida, e ir migrando para um tom otimista até mostrar a solução em um carrossel de imagens com frases de efeito.
Bem estilo obvious.
Mas eu acho que a hora do alívio cômico já passou.
“Na medida em que mais pessoas começarem a questionar o modo de vida imposto, a grande exaustão pode se transformar em uma anomia — conceito usado para descrever uma situação em que os valores e regras que guiam o comportamento da sociedade estão enfraquecidos.”
A era dos exaustos: por que estamos cada vez mais cansados? - Revista Galileu
Chega o momento que é preciso encarar as multicrises: Israel, racismo, mudanças climáticas, resiliência das cidades, feminicídio, vício em bets, bomba-atômica etc etc etc.
E o que mais? O que falta?
Talvez — pirando aqui — a gente devesse começar questionando essa rotina tóxica de produtividade e positividade. E entender que não é o psicólogo, nem o psiquiatra, quem vai trazer a solução. Eles ajudam a sobreviver — porque a resposta não é individual.
Depois, quem sabe, admitir que as big techs lucram com o nosso adoecimento mental.
Aprender a usar as redes digitais de forma crítica e comedida.
Pressionar a classe política por uma regulamentação digital urgente.
E aí seguimos na luta de sempre: Educação emancipadora sem deixar ninguém para trás.
A saída é coletiva. E essa é a raiz do meu pessimismo.